Criar empregos: “interesse da nação”

.

Evidência do caráter alienado e alienante da política é a centralidade e apologia da “geração de empregos”.
 
 
 
Como se, para isso, bastasse um governante (ou qualquer outro “representante do povo“) dotado de “vontade de fazer”. Vai fazer parir de sua boa vontade milhares de “empregos”, para a felicidade geral dos trabalhadores.
 
Como se trabalhar em troca de salário não fosse o principal meio de transformação da própria vida em fardo, da própria subjetividade em máquina; o funcionário é aquele que deve funcionar, seja pra auto-imolação que for.
 
O ator político (expressão comum no discurso “filosófico” e “científico” sobre a política – ou seja, na conversa mole de jornalistas, publicitários, políticos profissionais e suas torcidas organizadas, eclésias, currais etc. – que pretende nos dizer bem menos do que diz!) vende a fantasia do “trabalho que dignifica o homem” e que só depende de uma boa alma, como a sua, pra passar do verbo à carne.
 
Ele não costuma explicar o que na verdade significa essa vontade de investir na geração de empregos, às vezes nem fala em investir qualquer coisa. Mas se ele é um político de esquerda, os compromissos com seus invest…, digo, representados pode exigir alguma clareza, e assim é que ele articula a bazófia para demonstrar que “se é bom pro patrão, também é bom pro trabalhador”, e muitas vice-versas; portanto, é bom para toda a sociedade (são os interesses da “nação”! Da qual ele é o porta-voz, claro) que verbas públicas sejam entregues para tal e tal setor ou grupelho da burguesia; o nome disso é “criar condições” para se estender a produção, a distribuição, os serviços, para que se abra e amplie mercados etc. É a “parceria público-privada”: corrup…, digo, privatiz…, digo, financiamento da economia “brasileira”! Foi o Brasil quem me disse que quer assim!
 
Mas o nosso voluntarioso produtor de condições jamais vai admitir que é o capital, e não o Estado e a política, que determina tais condições para a criação de novos empregos. Acreditar que sem Estado não há sociedade é um pressuposto de sua atividade e ao mesmo tempo uma velha elucubração metafísica chulé, que se sustenta apenas quando nunca se ouviu falar em história.
 
De modo tal que só faltava a burguesia topar assumir os fins que o bom demiurgo político lhe sugeriu dar ao dinheiro público que enfia em seus bolsos privados. Claro, por vezes (ou sempre) ele é discretamente premiado por seu altruísmo social e sua generosa boa vontade, e não faz escândalo quando a burguesia resolve dar seus próprios fins privados às verbas da geração de empregos. Pois, convenhamos, quaisquer forem estes, sempre significarão dinheiro circulando, aquecendo a economia, criando algum emprego – nem que seja de flanelinha, uberite, desesperado, traficante, ladrão etc, tudo isso que move a máquina da caridade religiosa e seus dízimos, da reeducação cidadã pela pedagogia policial e penitenciária etc, etc.
 
(Religião e Direito, pilares da moral do homem-mercadoria, também giram os Sagrados Códigos da Economia.)
 
Em suma, o que é bom pro patrão é bom pro trabalhador, pro padre, pro policial e pro político.
 
Tudo isso quando até mesmo um plâncton é capaz de perceber o exato contrário.
 
 
 
A política e seus atores, seus palhaços e seus maquiadores, seus títeres e seus adestradores, seus vendedores de chiclete e seus barões querem perpetuar a “Aliança Capital-Trabalho”, eufemismo para o que nada mais é que – capital.
 
Pretendem imortalizar a forma mais radical do estranhamento humano, que produz não apenas um mundo desumano, mas principalmente o destrói por todos os lados, desde a natureza até os indivíduos.
 
A política não ousa, e nem pode ousar sequer fazer menção à realidade. Ela não é o lugar da crítica, mas da serventia. Não é a voz da verdade, mas do glacê sobre o ôco.
 
Quando o que mais precisamos não é de empregos, e sim destruir a sociabilidade do emprego, acabar com toda forma de “empregar” pessoas, usá-las como se fossem meios, e o pior, para realizar fins que não possuem sentido algum. Qual a finalidade do capital? Valorizar capital. Para quê? Para valorizar o capital ainda mais. Ad infinitum, ou pelo menos até findar a espécie humana.
 
Assim como não se trata de “integrar” os excluídos (por meio de bolsas-esmola), mas de despojar a todos da associação da exclusão.
 
 
 
– “Ah, você preferia estar desempregado???”
 
Chegou o esquerdista chupa-bola do patrão!
 
Não, eu preferia estar livre da coleira que você usa e defende, a única coisa que não apenas produz essa imensa miséria do trabalho assalariado, como também é a genitora em escala industrial dos decretos da obsolescência dos homens. Da qual, aliás, ninguém há de escapar. Devo implorar ao “empregador” que me parasite ainda mais, enquanto funciono pra ele?
 
.
 

Deixe um comentário